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Unidade 1


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Introdução

Olá, caro(a) aluno(a), é com muita satisfação que apresentamos a você o conteúdo a ser trabalhado nessa primeira Unidade do nosso material. Assim, a respectiva Unidade abordará, de forma objetiva, os aspectos históricos e legais que se referem ao conceito de infância.

Discutiremos, brevemente, sobre o significado da palavra conceito e o conceito de infância, assim, abordaremos o conceito de infância em períodos da história ocidental. Explicitaremos, também, sobre o surgimento da escola e, por fim, apresentaremos os fundamentos legais que regem a Educação Infantil, mais precisamente as diretrizes curriculares para a respectiva etapa escolar.

Bons estudos!

O Significado das Palavras Conceito e Infância

Antes de qualquer coisa, é preciso conhecer o que é conceito e o conceito de infância.

Conceito, do latim conseptus, significa “formar dentro de si”. Em outras palavras, conceito é uma representação construída pela mente humana sobre algo, um objeto, uma relação etc. Quando falamos em conceito de infância isso significa uma ideia de infância que não apresenta as diferenças entre as coisas em sua extensão semântica, pelo contrário, tratamo-las como idênticas. Para constituir o conceito de infância, reunimos ideias sobre crianças, brincadeiras de meninos e meninas, um período de nossa vida, a linguagem peculiar dos pequenos etc. Essas singularidades de um período de nossa vida são o que chamamos de infância, ou, melhor explicitando, um conceito que reúne todas as características da infância, mas como representação e não como realidade. Chegamos a um conceito por meio da análise de diversas coisas da mesma espécie.  

Outra dimensão importante da infância é seu contexto histórico. O conceito de infância surgiu histórica e epistemologicamente na sociedade moderna.

REFLITA

A infância

Vimos, até o momento, o quanto a infância é uma fase importante para o ser humano, ou seja, segundo Piaget, a infância é o tempo de maior criatividade na vida de um ser humano. Isso nos leva a refletir sobre como perdemos essa criatividade ao longo do crescimento, isto é, por que isso acontece? Como um adulto pode manter essa criatividade da infância?

Fonte: Elaborado pelas autoras.

Entre o século XV e o século XVIII, podemos dizer que temos o fim da chamada Idade Média e o início da Idade Moderna. São os historiadores que denominam os períodos históricos. Modernidade é, então, para os historiadores, o período que surgiu após o Renascimento; desse modo, Filosofia Moderna e Ciências Modernas, no sentido histórico, diz respeito ao período da história ocidental que se iniciou a partir do século XVII e vai até início do século XIX, quando podemos falar em Idade Contemporânea.

Figura 1.1 - Crianças brincando
Fonte: Oneblink / 123RF.

A palavra “moderno” vem do latim modernus e quer dizer “atual”, “agora”. Essa origem do conceito moderno mostra, na história do pensamento ocidental, uma divisão que foi estabelecida pelos pensadores hoje chamados de modernos, como Francis Bacon (1561–1626), por exemplo, que dizia que a “Antiguidade foi antiga e maior em relação a nós, mas em relação ao mundo, nova e menor”.

O debate sobre a superioridade dos modernos ou dos antigos surgiu na Itália em 1620, com Alessandro Tassoni, e está ligado à noção de história como progresso, sobretudo na França e na Inglaterra (ABBAGNANO, 1982, p. 58/p.649-650).

Os marcos para os estudos sobre a história da infância indicam o livro de Phillipe Ariès, História social da infância e da família, França, em 1960. Outros livros começam a aparecer no cenário dos estudos sobre a infância e compõem investigações sobre a vida das crianças em diferentes sociedades e períodos da história ocidental.

Figura 1.2 - Conceito de infância
Fonte: Inara Prusakova / 123RF.

O Conceito de Infância em Períodos da História Ocidental: Breves Questões

Como afirmam Nascimento, Brancher e Oliveira (2013), o registro historiográfico sobre a infância ocorreu tarde no campo dos estudos de história. Nem sempre a infância foi compreendida como hoje, no século XXI. As crianças eram vistas como adultos em miniatura, mas isso não quer dizer que fossem consideradas com direitos iguais aos dos adultos. A vida era relativamente igual para pessoas de diferentes idades, mas não existia uma consciência social da existência autônoma das crianças. As crianças não tinham o poder dos adultos e sofriam violência dos mais velhos.

[...] algumas pouquíssimas crianças podiam ter um poder imenso, como Luiz XVI, rei da França, a ponto de ser tratado como adulto por seus criados e cortesãos. Também havia o caso de pessoas que não conseguiam durante a vida toda sair da infância, como os escravos. No sul dos Estados Unidos, escravos eram tratados como meninos, "come here, boy", como eram conhecidos. Classificados como dependentes, eram tidos como seres inferiores, como nos conta Levin (1997). [...] Passado o estrito período de dependência física da mãe, esses indivíduos se incorporavam plenamente ao mundo dos adultos (LEVIN, 1997 apud NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

Na chamada Idade Média existia uma classificação das etapas da vida das pessoas.

Durante a Idade Média, antes da escolarização das crianças, elas e os adultos compartilhavam os mesmos lugares e situações, fossem eles domésticos, de trabalho ou de festa. Na sociedade medieval não havia a divisão territorial e de atividades em função da idade dos indivíduos, não havia o sentimento de infância ou uma representação elaborada dessa fase da vida.

Assim, foi durante o século XVII que se generalizou o hábito de pintar nos objetos e na mobília uma data solene para a família. Pode-se afirmar que foi na Idade Média que as “Idades da Vida” começaram a ter importância. Durante a Idade Média, então, existiam seis etapas de vida. As três primeiras, que correspondem à 1ª idade (nascimento/7 anos), 2ª idade (7/14 anos) e 3ª idade (14-21 anos), eram etapas não valorizadas pela sociedade. Somente a partir da 4ª idade, a juventude (21-45 anos), as pessoas começavam a ser reconhecidas socialmente. Ainda existiam a 5ª idade (a senectude), considerando a pessoa que não era velha, mas que já tinha passado da juventude; e a 6ª idade (a velhice), dos 60 anos em diante até a morte. Tais etapas alimentavam, desde esta época, a ideia de uma vida dividida em fases (ARIÈS, 1973 apud NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

Na modernidade, pode-se dizer que surgiu uma primeira concepção de infância devido aos estudos da filosofia, do corpo e da mente, levando os adultos à preocupação com as crianças. Desse modo, “[...] a palavra infância passou a designar a primeira idade de vida: a idade da necessidade de proteção, que perdura até os dias de hoje” (NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

Pode-se afirmar que, nesse momento, as crianças foram tomadas como seres que precisavam de cuidados especiais, de uma educação e de uma rígida disciplina para serem adultos socialmente aceitos. As crianças foram tomadas como seres irracionais, sem coerência.

[...] um provérbio da época, que diz: Quem não usa a vara, odeia seu filho. Com mais amor e temor castiga o pai ao filho mais querido. Assim como uma espora aguçada faz o cavalo correr, também uma vara faz a criança aprender (LEVIN, 1997, p. 230 apud NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

Com a visão de Rousseau, que recomendava uma Educação Infantil sem castigos, sem prisões e sem exércitos, as crianças tornaram-se objetos de muitas preocupações e estudos. Com a Revolução Francesa, o Estado focou seu interesse pelo bem-estar das crianças e pela escolarização (NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

No século XIX, o sociólogo Durkheim procurou ligar a infância à escola com o objetivo de instruir as crianças pela moral e pela disciplina. Era necessário dominar os ímpetos infantis.  

Para controlar "os humores endoidecidos" das crianças, Durkheim (1978) propôs três elementos fundamentais para desenvolver a educação moral das novas gerações, que deverão ser capazes de adequar-se às regras do jogo social, político e econômico. Portanto, educar a criança passa a significar moralizá-la no sentido de inscrever na subjetividade desta os três elementos da moralidade. Explica o referido autor que educar é inscrever na subjetividade da criança os três elementos da moralidade: o espírito de disciplina (graças ao qual a criança adquire o gosto da vida regular, repetitiva, e o gosto da obediência à autoridade); o espírito de abnegação (adquirindo o gosto de sacrificar-se aos ideais coletivos) e a autonomia da vontade (sinônimo de submissão esclarecida) (DURKHEIM, 1978 apud NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).                                                                            

Na época contemporânea, do final do século XIX até agora, com a institucionalização da escola, muitos estudos foram feitos e aos poucos se consolidou o conceito de infância. Dessa forma, esse conceito ganha amplo significado quando começamos a falar em pediatria, pedagogia, psicologia, entre outros campos de investigação para pensar o desenvolvimento do corpo e da mente da criança. A isso chamamos de construção social da criança. Foi o período em que tivemos espaços exclusivos para crianças, roupas exclusivas para crianças, cabelos etc. As escolas tinham salas separadas por idades. Agora, as crianças somente encontravam os adultos na vida em família. Não podemos omitir aqui que as crianças pobres, embora vistas também como crianças diferenciadas de adultos, podiam trabalhar. O trabalho infantil, embora extirpado pela lei, permanece em países que burlam e exploram os pequenos.

Hoje, fala-se ainda em extinção da infância, porque cada vez mais se percebe uma linha tênue entre crianças e adultos. Porém, isso ocorre devido a conflitos em países que ora se orientam pelas religiões, ora por países que querem penalidades maiores para os menores, dado a época de consumo de drogas, do trato diferente com a sexualidade etc.

“As fronteiras entre a infância e a fase adulta estão cada vez mais tênues”, disse Adatto (1998, p. 5), diretor do Programa de Estudos da Criança na Universidade de Harvard: Estamos obcecados por crianças, mas isto não significa que estejamos preservando a noção de infância. Estamos obcecados porque as barreiras entre a infância e a idade adulta estão sendo rompidas, e não sabemos ao certo aonde isto leva (NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

Entretanto, não devemos esquecer que na Grécia antiga crianças eram usadas no exercício da sexualidade. Em muitas épocas históricas as crianças com mais de sete anos de idade entravam na vida sexual como os adultos. “Mesmo nos Estados Unidos, a idade exigida para o consentimento de relações sexuais ficava abaixo dos dez anos, até o fim do século XIX” (NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2013).

Quando Hurst (1998) pesquisou a história dos programas de Justiça para a infância nos Estados Unidos, deu o seguinte título ao seu relatório: “Tribunal Juvenil aos 100 Anos de Vida: O Fim do Otimismo”. Hurst (1998) destacou que, no final de 1996, foram aprovadas leis que autorizam a abertura de processo ou o julgamento de jovens de 14 anos como se fossem adultos. “Fizemos uma evidente mudança de rumo e procuramos agir como se, em matéria de criminalidade, a infância não existisse”, opinou.

Outro pesquisador importante em nossa época é Neil Postman, autor do livro O desaparecimento da infância (2005). Para ele, se a infância desaparecer, a sociedade também perde. O desaparecimento da infância se deve, em parte, pela mídia, que adultiza a criança, apagando as diferenças entre criança e adulto. Todavia, é um desaparecimento forjado por um sistema que investe no consumo exacerbado, no mercado como substituto da mãe, do pai, da família, das amizades, enfim, da vida coletiva.

Figura 1.3 - Como era vista uma criança antigamente
Fonte: Katrinaelena / 123RF.

O Surgimento da Escola: Algumas Considerações

Podemos falar sobre escola como conhecemos em nosso século e sobre a produção de livros didáticos escolares remetendo-nos ao início pela história da pedagogia moderna, inaugurada por João Amós Comenius (1582–1670), nascido na Bohemia.

Comenius participou de um movimento do Cristianismo que tinha como objetivo realizar a Terceira Reforma. A primeira teria sido feita por Jesus Cristo, a segunda por Lutero e terceira seria obra de um coletivo entendido aqui como coletivo de intelectuais que queriam a democratização dos conhecimentos contra os segredos do ofício, o que a historiadora Frances Yates chamou de Iluminismo Rosa-Cruz (MAZZOTTI, 2005).

Tratava-se de um pensamento da modernidade que pensava a aliança entre o trabalho intelectual e manual, pensava o conhecimento baseado no método científico da observação e experimentação, e pensava também uma forma de comunicação desses conhecimentos (MAZZOTTI, 2005).

A pedagogia comeniana ou moderna propunha então a formação de um novo homem pela unificação do trabalho intelectual e manual, prático, empírico. Nesse movimento, temos ainda o amigo de Comenius, Francis Bacon (1561–1626), Samuel Hartlib (1600–1662), Maurício de Nassau (1604–1679) e talvez, como diz Mazzotti (2005), René Descartes (1596–1650).

Para Comenius, se havia um método para conhecer, haveria também um método para ensinar. Para conhecer, o método era baseado na observação e na experimentação, para ensinar deveríamos ter o mesmo. A observação e a experimentação deveriam substituir a exegese, ou seja, a explanação e interpretação dos textos como a prática medieval. Em outras palavras, é a união do trabalho intelectual e manual do qual fala Comenius (MAZZOTTI, 2005).

Desse modo, a pedagogia comeniana pensa a cabeça da criança como folha de papel em branco, que poderia receber a inscrição ou o ensino. Esse seria o caminho seguro para uma Educação Universal, condição básica para a formação de um novo homem (MAZZOTTI, 2005).

Desde o século XVI as experimentações no campo com plantas e animais e os livros de divulgação desses efeitos circulavam pela Europa em manuais baratos que a imprensa, ainda pouca à época, já fazia. Mazzotti (2005) indica que, em 1550, Adam Riese publicara um manual de aritmética que contou com 38 edições. Essa prática estabeleceu um modo de ensinar tudo a todos. O livro didático teria conteúdos novos, científicos, desenhos e línguas, de modo a alcançar todos que estivessem na escola. O próprio Comenius escreveu manuais de latim e alemão e uma cartilha, nos moldes da cartilha que vigora até hoje e que ainda é utilizada por várias instituições de ensino, ou seja, o manual para alfabetizar crianças, conhecida como “Caminho Suave”.

SAIBA MAIS

Manual Alfabetizar, retirar a data de acesso a pesquisa

Para que você possa compreender melhor sobre o manual para alfabetizar, citado anteriormente, denominado Orbispictus, acesse o respectivo site e amplie seus conhecimentos sobre o assunto apresentado. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-73072011000300014&script=sci_arttext.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Comenius preconizava uma educação de massas com as diretivas:

I. Toda juventude (exceto a quem Deus negou a inteligência) seja formada; II. Em todas aquelas coisas que podem tornar o homem sábio, probo e santo. III. Que esta formação, enquanto preparação para a vida, esteja terminada antes da idade adulta. IV. Que esta mesma formação se faça sem pancadas, sem violência e sem qualquer constrangimento, com a máxima delicadeza, com a máxima doçura e como que espontaneamente […]. V. Que todos se formem com uma instrução não aparente, mas verdadeira, não superficial, mas sólida; ou seja, que o homem, enquanto animal racional, se habitue a deixar-se seguir não pela razão dos outros, mas pela sua, e não apenas a ler nos livros e o entender, ou ainda reter e recitar de cor as opiniões dos outros, mas penetrar por si mesmo no âmago das próprias coisas e a tirar delas conhecimentos genuínos e de utilidade. Quanto à solidez moral e da piedade, deve dizer-se o mesmo. VI. Que essa formação não seja penosa, mas facílima, isto é, não consagrando senão quatro horas aos exercícios públicos [sala de aula] e de tal maneira que um só professor seja suficiente para instruir, ao mesmo tempo, centenas de alunos, com um esforço dez vezes menor que aquele que atualmente costuma despender-se para ensinar cada um dos alunos (COMÉNIO, 1966, p.163-164 apud MAZZOTTI, 2005, p. 3).

Essas metas somente seriam alcançáveis se o professor mudasse seu método de dar aula e fizesse uma habilidosa repartição do tempo, da matéria e do método (MAZZOTTI, 2005). Aliás, tempo e espaço seriam as duas categorias essenciais da escola, como Kant (1724–1804) afirmou mais tarde. Tempo do professor e dos conteúdos do livro didático (LD); e espaço da sala de aula. A esse projeto escolar Comenius chamou de Didacografia.

Na Didacografia (agrada-me usar esta palavra), as coisas se passam precisamente da mesma maneira [na tipografia]. O papel são os alunos, em cujos espíritos devem ser impressos os caracteres das ciências. Os tipos são os livros didáticos e todos os instrumentos propositadamente preparados para que, com sua ajuda, as coisas a aprender se imprimam nas mentes com pouca fadiga. A tinta é a viva voz do professor que transfere o significado das coisas, dos livros para as mentes dos alunos. O prelo é a disciplina escola que a todos dispõem e impele para se embeberem dos ensinamentos (COMENIUS, 1966, p. 4258 apud MAZZOTTI, 2005, p. 4).

O livro didático é assim instituído como o percurso escolar. A nova escola é aquela que ensina TUDO a todos. Está instituído também o saber escolar, o saber que advém dos saberes científicos da nova sociedade.

Os livros didáticos e os demais materiais para o ensino são a materialização de um saber, são os “caracteres das ciências”. Neste sentido, os saberes escolarizados estão no lugar de cada uma das disciplinas científicas ou filosóficas (na época não havia distinção entre elas). Estas disciplinas, depuradas pelos especialistas, são os conhecimentos considerados válidos e corretos, afastando toda polêmica, toda disputa, uma vez que interdita a leitura de livros variados sobre o mesmo assunto. O debate, o confronto de opiniões, como se fazia na escola Medieval, é pernicioso por distrair o espírito (MAZZOTTI, 2005, p. 4).

Estava assim dado o percurso que temos ainda hoje no século XXI, ou seja, conforme explicita Mazzotti (2005, p. 4): “O livro didático pôde instituir o ensino de massas. O ensino das novas sociedades burguesas. Instituiu a gramatização, e por meio da gramática grega e latina, pôde-se ensinar as línguas. Pode-se ensinar o cálculo, as ciências”. A escola moderna tornou homogêneo o ensino e o conhecimento. O livro didático é, para usar a metonímia de Comenius, a partitura do professor. Com isso,

Ao pretender fazer da escola uma manufatura capaz de produzir um ensino de massa e de mesma qualidade estabeleceu-se um método de trabalho que prescinde a formação do professor. Este método objetiva ou retifica o trabalho docente, bem como o do discente, por meio dos instrumentos de ensino — o livro didático, o manual de ensino, os recursos audiovisuais, os computadores, em nossa época etc. —, com vistas a produzir o maior número possível de pessoas escolarizadas. A meta “ensinar tudo a todos” requer esta objetivação, que faz do professor um organista que executa uma partitura, uma vez que ensinar é o mesmo que escrever sobre uma folha de papel em branco (MAZZOTTI, 2005, p. 6).

Nos dias de hoje, século XXI, ainda temos a partitura do professor, agravada pelas condições políticas de termos salas mais e mais cheias e as condições de trabalho do professor com mais e mais aulas. Não estaria a partitura garantindo a objetivação do trabalho e os salários mais baixos, uma vez que o LD empresta ao professor uma outra voz que não é a sua? E, por estranha ironia, o livro didático que antes fora produzido para promover a aliança entre o trabalho intelectual e manual e sair da exegese medieval, tornou a sala de aula, a escola e o professor leitores de um livro só. Tal como Comenius criticava.

Figura 1.4 - Sala de aula de antigamente
Fonte: Liligraphie / 123RF.

Fundamentos Legais: as Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil e a Base Nacional Comum Curricular

Foi tardia no país a constituição das Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil. Sua regulamentação data de 1996, quando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDBEN 9.394/1996, definiu que a Educação Infantil era a primeira etapa da Educação Básica. Aliás, foi tardia a escola no Brasil. Até 1790, Portugal proibia, na sua colônia brasileira, escolas, reuniões e jornais.

Nono (2013) observa que a Constituição Fede­ral de 1988, a Constituição Cidadã, já reconhecia o direito da criança às creches e pré-escolas. A Constituição de 1988 observa o caráter educativo no lugar da atitude assistencialista que até então o Brasil fazia com as crianças de 0 a 6 anos.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394/96) regulamenta a Educação Infantil, definindo-a como primeira etapa da Educação Básica e indicando como sua finalidade o desenvolvimento integral da criança de zero a seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (NONO, 2013).

Em 1999, nesse âmbito da legislação, são criadas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Resolução CNE/CEB n. 1, de 07/04/1999). Essas Diretrizes foram revogadas pela Resolução CNE/CBE n. 5, de 17 de dezembro de 2009, com a composição de novas diretrizes para a fase de zero aos seis anos de idade da Educação Básica.

De acordo com Nono (2013), essa Resolução foi publicada no Diário Oficial de 18 de dezembro de 2009, na Seção 1, página 18. Vejamos o que prescreve para a Educação Infantil:

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no art. 9º, § 1º, alínea “c” da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, e tendo em vista o Pare­cer CNE/CEB nº 20/2009, homologado por Despacho do Senhor Ministro de Estado da Educação, publicado no DOU de 9 de dezembro de 2009, resolve:
Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil a serem observadas na organização de propostas pedagógicas na Educação Infantil.
Art. 2º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil ar­ticulam-se com as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica e reúnem princípios, fundamentos e procedimentos definidos pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, para orientar as políticas públicas na área e a elaboração, planejamento, execução e avalia­ção de propostas pedagógicas e curriculares.
Art. 3º O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimen­to integral de crianças de 0 a 5 anos de idade.
Art. 4º As propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, de­seja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura.
Art. 5º A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, é ofe­recida em creches e pré-escolas, as quais se caracterizam como espaços institucionais não domésticos que constituem estabelecimentos educacio­nais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle social.
§ 1º É dever do Estado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gra­tuita e de qualidade, sem requisito de seleção.
§ 2° É obrigatória a matrícula na Educação Infantil de crianças que com­pletam 4 ou 5 anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrí­cula.
§ 3º As crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março devem ser matriculadas na Educação Infantil.
§ 4º A frequência na Educação Infantil não é pré-requisito para a matrícula no Ensino Fundamental.
§ 5º As vagas em creches e pré-escolas devem ser oferecidas próximas às residências das crianças.
§ 6º É considerada Educação Infantil em tempo parcial, a jornada de, no mínimo, quatro horas diárias e, em tempo integral, a jornada com duração igual ou superior a sete horas diárias, compreendendo o tempo total que a criança permanece na instituição.
Art. 6º As propostas pedagógicas de Educação Infantil devem respeitar os seguintes princípios:
I – Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respei­to ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades.
II – Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática.
III – Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liber­dade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais.
Art. 7º Na observância destas Diretrizes, a proposta pedagógica das insti­tuições de Educação Infantil deve garantir que elas cumpram plenamente sua função sociopolítica e pedagógica:
I - oferecendo condições e recursos para que as crianças usufruam seus direitos civis, humanos e sociais;
II - assumindo a responsabilidade de compartilhar e complementar a edu­cação e cuidado das crianças com as famílias;
III - possibilitando tanto a convivência entre crianças e entre adultos e crian­ças quanto a ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas;
IV - promovendo a igualdade de oportunidades educacionais entre as crianças de diferentes classes sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às possibilidades de vivência da infância;
V - construindo novas formas de sociabilidade e de subjetividade com­prometidas com a ludicidade, a democracia, a sustentabilidade do planeta e com o rompimento de relações de dominação etária, socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional, linguística e religiosa.
Art. 8º A proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve ter como objetivo garantir à criança acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à con­fiança, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças.
§ 1º Na efetivação desse objetivo, as propostas pedagógicas das instituições de Educação Infantil deverão prever condições para o trabalho coletivo e para a organização de materiais, espaços e tempos que assegurem:
I - a educação em sua integralidade, entendendo o cuidado como algo in­dissociável ao processo educativo;
II - a indivisibilidade das dimensões expressivo-motora, afetiva, cognitiva, linguística, ética, estética e sociocultural da criança;
III - a participação, o diálogo e a escuta cotidiana das famílias, o respeito e a valorização de suas formas de organização;
IV - o estabelecimento de uma relação efetiva com a comunidade local e de mecanismos que garantam a gestão democrática e a consideração dos saberes da comunidade;
V - o reconhecimento das especificidades etárias, das singularidades indi­viduais e coletivas das crianças, promovendo interações entre crianças de mesma idade e crianças de diferentes idades;
VI - os deslocamentos e os movimentos amplos das crianças nos espaços internos e externos às salas de referência das classes e à instituição;
VII - a acessibilidade de espaços, materiais, objetos, brinquedos e instru­ções para as crianças com deficiência, transtornos globais de desenvolvi­mento e altas habilidades/superdotação;
VIII - a apropriação pelas crianças das contribuições histórico-culturais dos povos indígenas, afrodescendentes, asiáticos, europeus e de outros pa­íses da América;
IX - o reconhecimento, a valorização, o respeito e a interação das crianças com as histórias e as culturas africanas, afro-brasileiras, bem como o com­bate ao racismo e à discriminação;
X - a dignidade da criança como pessoa humana e a proteção contra qual­quer forma de violência – física ou simbólica – e negligência no interior da instituição ou praticadas pela família, prevendo os encaminhamentos de violações para instâncias competentes.
§ 2º Garantida a autonomia dos povos indígenas na escolha dos modos de educação de suas crianças de 0 a 5 anos de idade, as propostas pedagógicas para os povos que optarem pela Educação Infantil devem:
I - proporcionar uma relação viva com os conhecimentos, crenças, valores, concepções de mundo e as memórias de seu povo;
II - reafirmar a identidade étnica e a língua materna como elementos de constituição das crianças;
III - dar continuidade à educação tradicional oferecida na família e arti­cular-se às práticas sócio-culturais de educação e cuidados coletivos da comunidade;
IV - adequar calendário, agrupamentos etários e organização de tempos, atividades e ambientes de modo a atender as demandas de cada povo in­dígena.
§ 3º - As propostas pedagógicas da Educação Infantil das crianças filhas de agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados e acampados da reforma agrária, quilombolas, caiçaras, povos da floresta, devem:
I - reconhecer os modos próprios de vida no campo como fundamentais para a constituição da identidade das crianças moradoras em territórios rurais;
II - ter vinculação inerente à realidade dessas populações, suas culturas, tradições e identidades, assim como a práticas ambientalmente sustentá­veis;
III - flexibilizar, se necessário, calendário, rotinas e atividades respeitando as diferenças quanto à atividade econômica dessas populações;
IV - valorizar e evidenciar os saberes e o papel dessas populações na pro­dução de conhecimentos sobre o mundo e sobre o ambiente natural;
V - prever a oferta de brinquedos e equipamentos que respeitem as carac­terísticas ambientais e socioculturais da comunidade.
Art. 9º As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brin­cadeira, garantindo experiências que:
I - promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movi­mentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança;
II - favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o pro­gressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestu­al, verbal, plástica, dramática e musical;
III - possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação e in­teração com a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos;
IV - recriem, em contextos significativos para as crianças, relações quanti­tativas, medidas, formas e orientações espaço-temporais;
V - ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades indi­viduais e coletivas;
VI - possibilitem situações de aprendizagem mediadas para a elaboração da autonomia das crianças nas ações de cuidado pessoal, auto-organiza­ção, saúde e bem-estar;
VII - possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades no di­álogo e reconhecimento da diversidade;
VIII - incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questio­namento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza;
IX - promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversifi­cadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotogra­fia, dança, teatro, poesia e literatura;
X - promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento da biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o não desperdício dos recursos naturais;
XI - propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifesta­ções e tradições culturais brasileiras;
XII - possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores, máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos.
Parágrafo único - As creches e pré-escolas, na elaboração da proposta cur­ricular, de acordo com suas características, identidade institucional, es­colhas coletivas e particularidades pedagógicas, estabelecerão modos de integração dessas experiências.
Art. 10. As instituições de Educação Infantil devem criar procedimentos para acompanhamento do trabalho pedagógico e para avaliação do desen­volvimento das crianças, sem objetivo de seleção, promoção ou classifica­ção, garantindo:
I - a observação crítica e criativa das atividades, das brincadeiras e intera­ções das crianças no cotidiano;
II - utilização de múltiplos registros realizados por adultos e crianças (re­latórios, fotografias, desenhos, álbuns etc.);
III - a continuidade dos processos de aprendizagens por meio da criação de estratégias adequadas aos diferentes momentos de transição vividos pela criança (transição casa/instituição de Educação Infantil, transições no interior da instituição, transição creche/pré-escola e transição pré-escola/Ensino Fundamental);
IV - documentação específica que permita às famílias conhecer o trabalho da instituição junto às crianças e os processos de desenvolvimento e apren­dizagem da criança na Educação Infantil;
V - a não retenção das crianças na Educação Infantil.
Art. 11. Na transição para o Ensino Fundamental a proposta pedagógica deve prever formas para garantir a continuidade no processo de apren­dizagem e desenvolvimento das crianças, respeitando as especificidades etárias, sem antecipação de conteúdos que serão trabalhados no Ensino Fundamental.
Art. 12. Cabe ao Ministério da Educação elaborar orientações para a implementação dessas Diretrizes.
Art. 13. A presente Resolução entrará em vigor na data de sua publica­ção, revogando-se as disposições em contrário, especialmente a Resolução CNE/CEB nº 1/99 (NONO, 2013).

Desde então, muitos estudos e proposições práticas para a Educação Infantil foram feitos. Afirma Nono (2013) que:

Entre tais temáticas, estão o planejamento do trabalho educativo com crianças de 0 a 6 anos, a necessária associação entre educar e cuidar nas creches e pré-escolas, o brincar na Educação Infantil, o espaço e o tempo na Educação Infantil, o processo de aquisição da leitura e da escrita na infância, a interação de crianças de idades diferentes, a adaptação da criança pequena às creches e pré-escolas etc. Mais recentemente, algumas pesquisas têm buscado revelar o que pensam educadores, crianças e comunidade a respeito das creches e pré-escolas brasileiras – Consulta sobre a Qualidade do Ensino Infantil, com assessoria da Fundação Carlos Chagas, 2007 (CAM­POS; CRUZ, 2007) e outras têm apontado, inclusive, dados quantitativos referentes ao aten­dimento da criança de 0 a 3 anos em creches no Brasil (apenas 13% dos quase 11,5 milhões de crianças brasileiras com idades entre 0 e 3 anos frequentam creches, apesar de esse ser um direito garantido por lei, de acordo com a pesquisa Aspectos Complementares da Educação 2004, realizada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD, divulgada neste ano de 2007.

Em decorrência das novas orientações para a formação do professor de Educação Infantil, as “Diretrizes Curriculares Na­cionais para o Curso de Pedagogia (Resolução CNE/CP n. 1, de 15 de maio de 2006) (BRA­SIL, 2006) apontam a necessidade da formação do aluno deste curso para atuar na gestão e no ensino na Educação Infantil” (NONO, 2013).

Também não deixa de ser preocupação na área da Educação Infantil caminhar as melhorias das ações pedagógicas com o avanço das políticas públicas no Brasil, ou seja, a) democratização do acesso das crianças a creche e pré-escola em termos de aumento do número de matrículas e b) políticas públicas de valorização dos profissionais da área nas esferas municipais e estaduais de ensino encaminhadas pelo sistema federal. Houve a aprovação, para a valorização dos profissionais da Educação Infantil do Fundo de Manutenção e Valorização dos profissionais da Educação, o Fundeb. Ocorreu também a ampliação do ensino fundamental para nove anos (NONO, 2013). Infelizmente, em algumas regiões os recursos do Fundeb são utilizados nas esferas municipais e estaduais pelas secretarias de esporte, o que é ilegal.

Isso significa que ainda existem muitos desafios para uma real e boa educação para as crianças pequenas. Ainda busca-se consenso nas práticas e na aplicação das políticas públicas e propostas pedagógicas.

Para Nono (2013), é importante destacar:

[...] a divulgação, pelo Ministério da Educação, no final da década de 1990, do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), documento orientador do trabalho a ser desenvolvido nas creches e pré-escolas, com apresentação de ob­jetivos e conteúdos a serem trabalhados nessa etapa educacional e com orientações didáticas, e relativas à avaliação do desenvolvimento da criança. [...]

Sobre ele, a professora Neide Barbosa Saisi escreve:

O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, elaborado e difundido pelo Ministério da Educação e do Desporto (MEC), em 1998, em consonância com a LDB, acompanha o processo de regulamentação da Educação Infantil, mas não se constitui em instrumento legal obrigatório a ser seguido pelos educadores dessa faixa etária. Consiste em um “guia de reflexão” cujo objetivo é contribuir para a elaboração dos projetos edu­cacionais propostos pelas instituições de Educação Infantil. O Referencial, composto de três volumes, consiste em uma resposta que o MEC procura dar às necessidades de orientação apontadas por estudos realizados [...]. Assim, o Referencial parte da perspectiva de ser incorporado ao projeto educacional da instituição caso ele traduza a vontade dos educadores en­volvidos e atenda às necessidades específicas de cada equipamento (SAI­SI, 2003, p. 101).

Outros documentos estão sendo publicados pelo MEC com o objetivo de subsidiar as práticas presentes nas escolas de Educação Infantil. Entre tais documentos, todos de acesso livre, via site do MEC (www.mec.gov.br), estão os Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil (BRASIL, 2006); Indicadores da Qualidade na Educação Infantil (BRASIL, 2009); Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (2006); Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à Edu­cação (BRASIL, 2006); Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças (CAMPOS; ROSEMBERG, 2009).

No documento Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fun­damentais das crianças (CAMPOS; ROSEMBERG, 2009), editado pela primeira vez em 1995, são apresentados os direitos das crianças que devem ser respeitados pelas creches e são descritas as situações que representam o atendimento destes direitos:

Figura 1.5 - Direito de brincar
Fonte: Famveldman / 123RF.

SAIBA MAIS

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

Veja o documentário sobre a Lei de Diretrizes e Bases. Aula sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Professora Geovana Caldeira, Minas Gerais.

Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=qHAf3xlHc0Q.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Outros aspectos da Educação Infantil dizem respeito às crianças que não têm, ainda, apesar de todas as leis de amparo e proteção, acesso às escolas, nem às suas necessidades, tampouco às suas culturas. Estamos falando das crianças de diversas nações indígenas, com suas línguas, religiões e lógicas de viver bem diferentes da sociedade branca e ocidental, que vive uma lógica consumista e até mesmo predatória. Os professores indígenas e a FUNAI preconizam uma instrução bilíngue e dois tipos de educação: a da escola e a da comunidade e suas tradições culturais previstas na LDBEN/1996. Outros grupos de crianças também têm sua lógica diferenciada: aquelas que apresentam necessidades especiais.

Sem o respeito às diversas culturas e às questões cognitivas, teremos uma educação excludente e seletiva, reforçando a desumanização nas escolas. É claro que a escola sozinha não remove a desumanização da infância. Há outras lógicas, estruturas como, por exemplo, a própria existência dos professores nas escolas públicas, que vivem nas fronteiras desta desumanização. No entanto, como clama o professor Miguel Arroyo (2017, p. 61) temos a “[...] obrigação moral como profissionais de extirpar toda estrutura, toda lógica e todo ritual, excludentes e seletivos que reforcem os processos de exclusão e desumanização a que vêm sendo submetidos fora da escola”.

A dimensão básica da Educação Infantil é aprender a ser, conviver com seus semelhantes e contar com eles dividindo nossas histórias, brincadeiras, saberes e ignorâncias. As leis de proteção e acolhimento estão bem elaboradas, mas entre o espírito da lei e da ação ainda temos, no Brasil, um abismo. Ainda somos velhos e, muitas vezes, rejeitamos relações menos burocratizadas e frias. A LDBEN de 1996, as Diretrizes Curriculares, traz uma concepção ampliada da educação. Não somente está em jogo os conteúdos preconizados por essas leis e diretrizes, mas a formação humana das crianças, sua função socializadora, cultural e social. Trabalhar apenas os conteúdos e esquecer que todos estamos imersos em uma cultura que é diferente para diversos grupos é, em duras palavras, burlar as leis. As crianças de bairros abastados são diferentes das crianças de vilas, de morros, de periferias. Em síntese, não há um ideal de criança. Nem de professor. O ofício de mestre é, nas palavras de Arroyo (2017), um dever-ser incômodo.

REFLITA

Escolas CIEPs

Pense sobre o que escreveu Darcy Ribeiro, antropólogo; idealizador da Universidade de Brasília, de que foi reitor; construiu as escolas CIEPs em tempo integral no Rio de Janeiro, no governo Leonel Brizola. Também foi o idealizador da Universidade Estadual do Norte Fluminense. Candidato pelo PDT a senador.

Fracassei em tudo o que tentei na vida.

Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.

Tentei salvar os índios, não consegui.

Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.

Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.

Mas os fracassos são minhas vitórias.

Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.

Fonte: Maia (2013 - on-line).

Outro documento que vem sendo muito discutido atualmente refere-se à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que consiste na definição dos direitos de aprendizagem dos alunos(as) brasileiros(as). A BNCC (2018, p. 7) descreve o seguinte:

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, de modo a que tenham assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o que preceitua o Plano Nacional de Educação (PNE).

No que se refere à BNCC de Educação Infantil, observamos que há uma preocupação com o desenvolvimento de dez competências gerais, ou seja, competências estas vistas como mobilização de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores para resolver problemas da vida cotidiana, conforme podemos observar nas palavras apresentadas na própria BNCC (2018, p. 8):

Ao longo da Educação Básica, as aprendizagens essenciais definidas na BNCC devem concorrer para assegurar aos estudantes o desenvolvimento de dez competências gerais, que consubstanciam, no âmbito pedagógico, os direitos de aprendizagem e desenvolvimento. Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho.

De acordo com Trevisan (2018):

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) dá um salto histórico ao reconhecer a Educação Infantil como uma etapa essencial e estabelecer direitos de aprendizagem para crianças de 0 a 5 anos. O documento também inova ao reconhecer essa etapa da Educação Básica como fundamental para a construção da identidade e da subjetividade da criança.

No mais, a BNCC de Educação Infantil nos apresenta seis direitos de aprendizagens que o professor deve ter sempre em mente, são eles: Conviver, Brincar, Participar, Explorar, Expressar e Conhecer-se.

A Base elenca, ainda, cinco Campos de Experiência para a Educação Infantil, que estabelecem quais são as experiências fundamentais para que a criança adquira a aprendizagem e se desenvolva. Tais campos salientam noções, habilidades, atitudes, valores e afetos que as crianças devem desenvolver dos 0 aos 5 anos, e buscam garantir os direitos de aprendizagem das crianças.

Indicação de leitura

História Social da Criança e da Família

Autor: Philippe Ariès

Ano: 2006

Editora: LTC

ISBN: 978-85-216-1347-3

Comentário: Descreve o surgimento do conceito de infância na sociedade ocidental. Na Idade Média, o conceito de infância não existia, no entanto, isso não significava que a criança era abandonada ou negligenciada, portanto, o conceito não deve ser confundido com a atenção que os pais davam aos seus filhos.

Considerações Finais

O(a) profissional que pretende se tornar um educador não é um docente completo quando pega seu diploma. O diploma é o ponto de partida e não de chegada à Educação Infantil. O docente caminhará sempre pelas fronteiras do conhecimento, como a história, a história da criança, da escola, dos livros didáticos. A legislação é uma orientação, não é uma teoria para se educar crianças pequenas. O percurso docente faz-se ao caminharmos.

Ao agirmos de maneira ética com nossos(as) alunos(as) e conosco, procuraremos, todo dia, aliar as teorias sobre o desenvolvimento mental das crianças e sobre as proposições indicadas pelas diretrizes para a Educação Infantil.

Para Arroyo (2017), professores e alunos sofrem a imposição das burocracias da mesma maneira, por isso, propõe que também os professores aprendam com projetos extracurriculares com mais cores, sejam em bairros ou em outras cidades, para realizar, como Paulo Freire previa, os vínculos entre a pedagogia e a humanização roubada.

Até a próxima!

Atividade

Vimos que o conceito de infância é relativamente recente em nossa sociedade, até então, a criança não recebia um olhar específico para o seu desenvolvimento. Dessa forma, conforme nossos estudos, por que o conceito de infância é relativamente recente entre nós?

Porque os pais resolviam ter vários filhos, isso fazia com que eles não tivessem tempo para educar todos de forma igualitária.

Incorreta. Na verdade, as crianças não recebiam um olhar adequado para essa etapa, não tinham um conceito relacionado à infância.

Porque antigamente as crianças eram vistas como adultos em miniatura, não existia uma consciência social da existência autônoma das crianças.

Correta. Antigamente, as crianças eram vistas como adultos em miniatura, mas isso não quer dizer que fossem consideradas com direitos iguais aos dos adultos. As crianças não tinham o poder dos adultos e sofriam violência dos mais velhos.

Porque antigamente as pessoas davam muita atenção para as crianças, o que provavelmente fazia com que elas fossem estudadas.

Incorreta. As crianças eram vistas como adultos em miniatura e não possuíam nenhum conceito para explicar essa etapa da vida humana, tão importante quanto as demais.

Porque as crianças não eram importantes, não tomavam decisões e não participavam das reuniões em família.

Incorreta. As crianças eram vistas como adultos em miniatura, essa etapa não tinha um conceito e nem era estudada como hoje em dia.

Porque as crianças eram abandonadas, negligenciadas ou até mesmo maltratadas.

Incorreta. A fase da infância não era vista com tanta ênfase, pois as crianças eram vistas como adultos em miniatura.

Atividade

De acordo com nossos estudos, verificamos que demorou algum tempo para que a criança recebesse um olhar voltado para o seu desenvolvimento. Assim, como pensar o conceito de infância hoje, quando estamos tratando de Educação Infantil?

A palavra infância, nesse período, passou a ser vista como uma etapa da vida adulta, ou seja, um adulto em miniatura.

Incorreta. A infância passou a ser estudada, ou seja, uma etapa em que as crianças precisam de cuidados especiais.

Nesse período, não há preocupação com as crianças, pois são apenas adultos em miniatura.

Incorreta. Na verdade, as crianças eram vistas como adultos em miniatura durante a Idade Média, na Modernidade, passaram a ter uma outra concepção.

A palavra infância passou a designar a primeira idade de vida: a idade da necessidade de proteção, que perdura até os dias de hoje.

Correta. Neste momento, as crianças foram tomadas como seres que precisavam de cuidados especiais, de uma educação e de uma rígida disciplina para serem adultos socialmente aceitos.

Nesse período, a criança se veste como adulto e age como adulto, não necessitando de cuidados.

Incorreta. As crianças passaram a ser vistas, a partir desse período, como seres que precisavam de cuidados.

Nesse período, a criança não tem importância, pois, muitas vezes, era abandonada pela família.

Incorreta. Nesse período, a criança necessita de cuidados especiais, por isso, é vista como a primeira fase da vida humana.

Atividade

Aprendemos que, com a Constituição Federal de 1988, a Educação Infantil passou a ser vista com outros olhares. Dessa forma, qual a colaboração da Constituição de 1988 para as Diretrizes e Bases da Educação?

A Constituição de 1988 observa o caráter educativo no lugar da atitude assistencialista que até então o Brasil tinha com as crianças de zero a seis anos.

Correta. A Constituição de 1988 retrata a questão da criança como algo educativo, ou seja, ela precisa estudar, e a Educação Infantil é tão importante quanto as demais etapas do ensino regular.

A Constituição de 1988 apresenta uma pequena contribuição para o processo de escolarização das crianças em fase pré-escolar, no entanto, não apresenta nenhuma consideração a esse respeito.

Incorreto. A Constituição de 1988 salienta a importância de a criança estudar e deixa clara essa obrigatoriedade.

Na Constituição de 1988 não observamos nenhuma consideração sobre a Educação Infantil, pois a criança é considerada um adulto em miniatura, portanto, não precisa estudar.

Incorreto. A Constituição salienta a importância de a criança em fase pré-escolar estudar e ter seus direitos garantidos em relação ao processo educativo.

Não notamos nenhum artigo específico voltado para Educação Infantil, ou seja, a criança não é vista como criança, e sim como uma adulto em miniatura que não precisa estudar, apenas brincar.

Incorreto. A Constituição salienta a importância de a criança estudar e ter esse direito garantido por lei.

Na Constituição de 1988 não há uma preocupação com a educação de nossas crianças, pois, ainda nesse período, a criança não tinha nenhuma importância para o Estado e para a família.

Incorreta. Na Constituição de 1988 notamos a consolidação da importância dos direitos das crianças à educação.

Unidade Concluída

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